quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Quinto passo - Perto do fim?

Foi aí que chegou a última entrevista. Óbvio que eu não sabia que era a última. Eu cheguei como das outras vezes... rezando para dar tudo certo... a entrevista foi marcada pouco antes da hora do almoço. Então eu saí super cedo de casa para a entrevista, iria comprar algo assim que a entrevista terminasse e depois correria para o trabalho, na época eu era multiplicadora, dava treinamento para novos funcionários.

Quando cheguei a psicóloga me chamou para a sala, com cara de poucos amigos misturada com sorriso sarcástico. Mal entrei e ela disse para eu sentar e ficar calada, pois eu já tinha falado o suficiente nas últimas entrevistas e que nessa eu iria ficar de boca fechada só escutando o que ela iria falar... bem desse jeito. Com todo ‘jeitinho’ que só alguém com simpatia aflorada poderia dizer.

Aí ela desatou a falar um monte de coisas do tipo: você é infantil, imatura, irresponsável... não tem noção do que significa ser mãe, já que não tem experiência nenhuma com a maternagem(palavra que, por sinal, ela gostava muito de falar) e a listagem de elogios seguiu-se... e eu fiquei só ouvindo... não só por ela ter dito para eu ficar calada... mas eu estava tão... sei lá... acho que assustada com o que ela falava... que não conseguia dizer nada. Eu não sei dizer quanto tempo de passou, mas o tempo todo era de ‘elogios’ a minha pessoa, focando sempre o quanto eu era irresponsável para ser mãe. Terminou dizendo que eu deveria me preparar mais, me entregou umas folhas com algumas informações sobre o processo de adoção, sugestões de livros e filmes sobre adoção... e antes de sair ‘recomendou’  que eu frequentasse um grupo de adoção... disse para ir até a outra sala pois a assistente social iria falar comigo e já estava me esperando.

Logo que eu entrei ela disse quem eu nem precisava sentar, pois ela seria rápida, pois estava muito ocupada. Disse que concordava com tudo o que a psicóloga havia dito(fiquei pensando como ela sabia o que ela havia dito... teriam combinado cada palavra, ou ela teria ficado atrás da porta ouvindo???)... e falou algo que me lembro perfeitamente: “você, visivelmente, nunca passou por nenhuma dificuldade na vida. É obvio que nunca passou por nenhum problema e nunca saberá lidar com os problemas que uma criança adotada terá, já que todos são problemáticos.”

Disse que elas iriam pensar em indicar uma reavaliação em aproximadamente 1 ano ou mais, mas que agora eu era incapaz de adotar. Que eu deveria aguardar que me avisariam quando o juiz decidisse, mas que não precisava ter esperanças, pois ele seguia o que elas colocassem no relatório.

Bem... como descrever o que ocorreu depois...

Sai de lá em silêncio... passei numa lanchonete e comprei uma esfiha de frango e fui para o trabalho.

Cheguei e pedi um minuto sozinha no laboratório(era o lugar onde o treinamento era dado). Tentando assimilar tudo... controlando a vontade de me atirar na frente de um caminhão e tentando entender o que eu havia feito de errado para aquelas mulheres... engolindo forçado a esfiha que não tinha gosto de nada...

Eu não queria contar para os meus pais ou para minha irmã naquele momento, só liguei para avisar que estava no serviço e que falava com eles depois... mas precisava falar com alguém sobre o ocorrido... então mandei um e-mail para Beth... é, porque falar era no sentido figurado... eu não conseguiria abrir a boca para falar do assunto... e se tentasse falar com ela por telefone, com certeza iria me derreter em lágrimas...

Escrevi um e-mail com tudo o que havia ocorrido no dia, e um pouco dos outros dias também...

Depois respirei fundo, organizei minhas coisas e abri a porta... tinham 28 pessoas aguardando o início do treinamento, que sempre começaram na hora certa e não seria naquele dia que seria diferente.

O retorno que eu tive da Beth é que ela falaria com a Sandra, e que pediria ajuda para resolver esse problema.

Mas a ajuda não saiu muito como o esperado. A Sandra falou com a psicóloga, e disse que ela teria que resolver isso... como dizer o que ocorreu depois...

 

Sábado de manhã, estou linda e sorridente penteando o Yagami, como fazia todos os dias, eis que recebo uma ligação. Resumindo a ligação... era a psicóloga, furiosa... falou que provavelmente eu tinha ficado com alguma dúvida e que eu deveria questionar ela, falei calmamente que não tinha ficado com dúvida nenhuma, aí ela ficou mais irritada. Disse que eu não tinha nada que ter ido reclamar para a Beth nem para a Sandra, que se eu tivesse alguma dúvida, deveria falar com ela, que ela tinha o destino da minha vida nas mãos dela, e que era apenas com ela que eu deveria falar e não reclamar com a Beth, Sandra ou mesmo o juiz...

 

Perguntei se ela tinha mais algo a falar e desliguei o telefone.

 

Acho que passou um bom tempo, e como não tive mais nenhum retorno, fui até o fórum para ver a quantas andava o processo, e não tive surpresa saber que elas tinham feito um relatório completamente negativo. Mesmo assim, fiquei muito chateada... queria chorar muito, mas estava com minha Mãe e minha Irmã, elas não mereciam isso... sempre estiveram ao meu lado, e novamente estavam sendo minha força.

Não vou dizer o que estava escrito no relatório, mas posso dizer que eu mesma, se tivesse que escolher, nunca daria uma criança para uma pessoa completamente louca, como elas haviam me descrito no relatório. Um relatório super estranho, falando coisas que não foram ditas.

Um rapaz muito gentil do fórum me disse que eu poderia acionar um advogado e pedir uma nova avaliação com técnicos diferentes, perguntei se era obrigatório ser por um advogado. Ele disse que não, disse que eu poderia escrever com calma e entregar depois, na hora disse que não queria esperar, tinha que fazer aquilo na hora, com a cabeça bem quente para não esquecer nenhum detalhe... então ele me deu uma folha e disse para que eu escrevesse a carta. E foi o que eu fiz... escrevi um texto gigante, com todos os detalhes do meu descontentamento, e e deixando bem claro que queria uma nova avaliação com técnicos diferentes, pois esses era desqualificados.

Ele incluiu minha carta no meu processo e disse que deveria aguardar a devolutiva do juiz.



Harumi Kawakubo